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Lendo e escrevendo

Lendo e escrevendo

Proibida na Normandia; Rosario Raro

03.06.25, Almerinda

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“Proibida na Normandia” – Rosario Raro, 2024

Esta é a história de uma mulher invulgar, determinada, que, apesar da sua vida, por ser mulher, não ficou para a história. Jornalista e fotógrafa, Martha Gellhorn nunca receou cobrir guerras no terreno, sabendo que muitos dos seus colegas de profissão relatavam guerras como se as vivenciassem no terreno, quando muitas vezes se limitavam a escrever relatos sem nunca saírem dos hotéis onde estavam hospedados. Martha Gellhorn esteve na guerra de Espanha (1937), da Finlândia (1939) e da China (1940). Não se vergou quando lhe foi recusada a acreditação para viajar num navio militar, que era concedida aos seus colegas jornalistas. Martha Gellhorn foi a única mulher presente no desembarque das tropas aliadas na Normandia no dia 6 de Junho de 1944, mas o seu nome e as suas crónicas foram censuradas e apagadas como se ela nunca lá tivesse estado. “Proibida na Normandia” é o relato dessa história.

Ela estava bem consciente da realidade do mundo do jornalismo eivado de misoginia, condescendência e paternalismo para com as jornalistas. No seu trabalho no terreno, apercebia-se do papel que as mulheres desempenhavam na guerra nas mais variadas esferas, muitas vezes subalternizadas apesar de tantas vezes desempenharem missões estratégicas e fundamentais; nas suas crónicas, ao contrário, sempre as visibilizava, nomeava-as, retirando-as do anonimato e valorizando o trabalho que desempenhavam. Ela própria, que tantas vezes foi referida com mulher de Ernest Hemingway, sempre rejeitou ser “uma nota de rodapé” na vida do marido ou de outra pessoa (págs. 129 e 363). Porque se bateu pelo direito ao reconhecimento do seu trabalho na frente de guerra, por querer publicar a verdade, mesmo quando ela não seguia a orientação do poder e da comunicação social, foi considerada antipatriota e censurada. Além de nunca ter recebido a Bronze Star Medal concedida a Hemingway, a crónica de Martha não existiu e “a sua presença foi apagada da praia de aço de Omaha” (p. 357)

O romance centrado na guerra e sendo uma reflexão sobre os horrores e as sequelas das guerras, tem um desenvolvimento ao longo do tempo desde os preparativos nas semanas anteriores ao desembarque, o desembarque propriamente dito e as semanas seguintes. Passado um ano do dia do desembarque, a comunicação social quer esquecer os horrores dos campos de concentração e a comunicação social prefere romancear e realidade, em vez de publicar a verdade.

Há, mesmo a acabar o livro, um desânimo uma desesperança expressos no vaticínio de H. G. Wells: «Se não acabarmos com a guerra, a guerra acabará connosco». A narradora imagina o mundo dois séculos depois e pergunta-se “Como será o mundo a 6 de Junho de 2144? Quem o contará?” (p. 361)

3 de Junho de 2025

Almerinda Bento

 

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