Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Lendo e escrevendo

Lendo e escrevendo

Natasha

27.02.22, Almerinda

IMG_7638.JPG

Natasha. Natalya.

Estive com a Natasha, dois dias antes de ela fazer 42 anos. Na altura ela disse-me que estava em Portugal há 21 anos, precisamente metade da sua vida tinha-a passado aqui.  

Nestes 21 anos casou, teve dois filhos – um rapaz e uma rapariga – divorciou-se depois de ter vivido uma situação grave de violência doméstica, sobreviveu, criou o seu próprio negócio depois de o patrão ter encerrado o salão de cabeleireiro, sobreviveu a uma pandemia que a obrigou-a a ter o seu próprio salão fechado… Natasha é uma mulher linda, uma lutadora nata, uma sobrevivente às intempéries da vida.

Quando lhe perguntava como ia a família reagindo às investidas russas quando ainda a guerra era uma palavra impensável e por cá se percebia pela comunicação social que a escalada agressiva era real, ela respondia-me com a serenidade que lhe conheço que os pais e irmã estavam tranquilos e que a haver problemas o plano B era a Polónia.

A serenidade de Natasha continuei a senti-la na sua voz quando lhe telefonei no início da semana passada. A família e o povo ucraniano já estavam habituados e depois da invasão da Crimeia tudo era possível… Depois do dia 24 envio-lhe uma mensagem escrita e ela responde-me destroçada por sentir que a sua cultura, a sua identidade, o seu modo de vida estão a ser postos em causa por Putin e pelo exército russo e agradece todo o carinho.

Fico com o coração destroçado. Vejo as imagens na televisão e vejo a Natasha em todas aquelas mulheres que carregam os filhos, meia dúzia de coisas essenciais, deixando para trás os filhos, os maridos, os pais, as casas, a sua vida.

O meu vizinho do lado também é ucraniano, mas não sei como se chama. Educado e simpático, a nossa relação é mais pelos gatos que ele tem e que eu tenho. Conversas de circunstância sobre gatos, o pagamento do condomínio sempre a horas, bom dia, boa tarde, até logo. Hoje encontrámo-nos na escada e disse-lhe que ia à manifestação pela paz na Ucrânia. Ergueu as sobrancelhas, sorriu e disse muito bom. Acrescentou que a família que vive perto da região “separatista” (assinalou as aspas com os dedos) de Donetsk, mas em território da Ucrânia, ainda está bem.

Junto-me aos manifestantes. Dizem que foram dez mil, não sei fazer essas contas. Logo as televisões irão dizer um número. Só sei que éramos muitos. Muitos jovens e muita gente de todas as idades. O azul e o amarelo predominavam nas bandeiras, na roupa, num lenço ao pescoço, no bandeirão que passou de mão em mão sobre as nossas cabeças. Gritámos Paz, Paz, Paz. Fim da Guerra. Batemos palmas. Estivemos juntos e solidários com um povo que está a ser invadido, que sofre e que resiste.

Os povos querem Paz e essa energia é irresistível. Por isso éramos tantos hoje aqui e um pouco por todo o mundo. Toda a força e solidariedade com o povo da Ucrânia.

27 de Fevereiro de 2022

3 comentários

Comentar post