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Lendo e escrevendo

Lendo e escrevendo

71 anos

14.10.19, Almerinda

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Há 71 anos um bebé nascia e não havia fotografias do/a recém-nascido/a. Não havia telemóveis, nem selfies e poucas eram as pessoas que tinham uma máquina fotográfica. Mesmo que tivessem, naquele tempo não fazia sentido fazer uma fotografia a um bebé que ainda pensava que estava no quentinho do ventre materno!

A primeira fotografia era geralmente com um ano, ou quando a criança já se sentava, ou conseguia estar de pé apoiada numa cadeira. Habitualmente, era feita num fotógrafo profissional com casa aberta e equipamento apropriado. Mas uma fotografia ao ar livre e em ambiente descontraído era para quem tinha a sorte de ter alguém na família com uma máquina e que soubesse tirar retratos.

Era o caso. A Isabelinha ao colo da mamã e o papá a tirar a fotografia, com todo o amor e saber que só ele tinha. Quantos meses teria ela aqui?

Há seis anos que não festejamos o 14 de Outubro com ela presente. É difícil, mas hoje pude ouvir alguns dos discos que ela adorava, na casa de campo que era dela e de que o poema da Elis Regina fala, como se lho tivesse dedicado. Elis Regina, Chico Buarque, Joan Baez... e tantos outros.

"Eu quero uma casa no campo Do tamanho ideal, pau-a-pique e sapé

Onde eu possa plantar meus amigos Meus discos e livros e nada mais!

Onde eu possa plantar meus amigos Meus discos meus livros e nada mais!

Onde eu possa plantar meus amigos Meus discos e meus livros e nada mais!"

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Parte-se e fica sempre aquele aperto na garganta. Saudades sempre.

14 de Outubro 2019

 

As Longas Noites de Caxias

12.10.19, Almerinda

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As Longas Noites de Caxias, Ana Cristina Silva, 2019

A cada novo livro de Ana Cristina Silva que leio, reforço a ideia que já anteriormente expressei de que “a autora revela a sua mestria em analisar e transmitir-nos estados de alma das personagens que cria”. Desta vez, partindo de factos verídicos, o foco é o que o medo faz às pessoas e até que ponto pode chegar a perversidade de uma pessoa para com outras. Para tal, evoca o instrumento que o Estado Novo utilizou para subjugar um povo – a PIDE –  analisando o uso do poder e do medo por parte dos torturadores e a capacidade de resistência por parte dos que eram presos pela PIDE.

A autora começa “As Longas Noites de Caxias” dedicando-o “A todos os resistentes antifascistas” e é clara a vontade, com este livro, de não deixar esquecer o que foi a polícia política de Salazar, num país e num mundo onde a democracia mostra sempre quão frágil e vulnerável é a todos os populismos e inimigos da liberdade e da democracia.

Antes, referi torturadores e torturados. Mas neste livro, as personagens são femininas, ou seja, torturadora e torturada. Laura Branco, a jovem natural de Mértola que, pelo seu excelente percurso escolar, consegue chegar à universidade graças à obtenção de bolsas de estudo e que acaba por ser presa. No Alentejo tinha convivido com crianças descalças, com crianças que iam para a escola com fome, com crianças que eram tratadas diferentemente consoante o seu estatuto social, mas em Lisboa, na faculdade, a compreensão dessa realidade ganhou outra dimensão no contacto com outros estudantes que falavam de discriminações, da sociedade de classes, da guerra colonial que abominavam, sempre com o risco da prisão ou de serem ouvidos por informadores, um pouco por todo o lado.

Maria Helena, tristemente conhecida por Leninha, é também apresentada, não apenas como a feroz chefe de brigada que se empenhava em torturar as presas nas longas noites de Caxias em que estava de turno durante a tortura do sono, mas que exibe um traço maléfico persistente de ódio à mãe vítima da brutalidade do marido que considerava uma mulher fraca, de maldade para com as colegas da escola e de arrogância e total falta de humanidade ou remorso quando, após o 25 de Abril, foi julgada e confrontada com as presas que tinha torturado. São inesquecíveis as páginas que relatam os métodos usados para com as detidas em Caxias, ou a descrição da forma bárbara como matou um gatinho que se lhe enrolou às pernas e a fez cair, num dia em que ainda menina ia para a escola. Esta mulher nunca mostrou o mais leve assomo de sensibilidade ou humanidade, excepto no seu amor à figura de Salazar e no conceito que tinha de amor à pátria. Tal como o beijo que Salazar lhe deu na testa quando criança a marcou para toda a vida, a morte do ditador foi como que o desabar do mundo e a convicção de que os métodos na tortura deviam ser intensificados, sobretudo nos estudantes que ela considerava inimigos da pátria.  

O livro tem muito interesse do ponto vista histórico e de testemunho do que era a polícia política, dos seus métodos, do medo que paralisava e tolhia um povo, mas também dos que resistiam e que acreditavam que a ditadura iria acabar. Maria Helena/Leninha foi uma figura sinistra e outros nomes de PIDEs temíveis são lembrados como Barbieri Cardoso, Tinoco ou outros. Os presos eram todos os que ousavam lutar contra a injustiça, a pobreza, a guerra, a ditadura, sendo neste caso focado o papel que o movimento estudantil teve no processo do derrube do regime fascista, com uma referência concreta ao assassinato do estudante Ribeiro dos Santos. Os informadores eram uma teia enorme e difusa e os torcionários eram maioritariamente homens, mas também houve mulheres, embora Leninha tenha sido a única mulher que conseguiu ascender a chefe de brigada, exactamente pela sua ambição de subir na hierarquia e pela ferocidade e brutalidade dos seus métodos. No fim do livro, doente, debilitada e sozinha, mas acompanhada pelo busto de Salazar na sala, ela confessa a uma colega da PIDE que a visita que aquele tempo em que torturou em Caxias tinha sido o período mais feliz da sua vida.

Agora que foi criada uma cadeira opcional no 12º ano – História, Culturas e Democracia – este “As Longas Noites de Caxias” poderia ser um excelente livro para constar da bibliografia a ser usada. Ou com toda a pertinência, fazer parte do Plano Nacional de Leitura.

10 de Outubro de 2019

Almerinda Bento

15 mulheres Nobel da Literatura

10.10.19, Almerinda

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É sempre uma alegria quando vemos uma mulher ser nomeada ou distinguida por uma actividade. No caso da Literatura, em que durante tantos anos elas andaram esquecidas ou tiveram de se esconder atrás de um nome masculino, não pode deixar de ser festejado mais um nome para figurar na lista dos que alcançaram o Nobel na Literatura.

Desde 1901, ano em que o Nobel da Literatura foi instituído, foram 15 as escritoras galardoadas. 15 nomes em 118 anos!

Hoje soubemos que a polaca Olga Tokarczuk - autora de "Viagens" - recebeu o Nobel referente a 2018. Para mim seria um nome desconhecido, caso não tivesse tido a oportunidade de pertencer a um Clube de Leitura, que tem sido um marco importante na minha vida de leitora. Obrigada Inês pelas escolhas que temos feito.

Aqui vai a lista das 15 mulheres galardoadas com o Nobel da Literatura:
1909 - Selma Lagerlof (Suécia)

1926 - Grazia Deledda (Itália)

1928 - Sigrid Undset (Noruega)

1938 - Pearl Buck (EUA)

1945 - Gabriela Mistral (Chile)

1966 - Nelly Sachs (Alemanha)

1991 - Nadine Gordimer (África do Sul)

1993 - Tony Morrison (EUA)

1996 - Wislawa Szymborska (Polónia)

2004 - Elfriede Jelinek´(Áustria)

2007 - Doris Lessing (Reino Unido)

2009 - Herta Muller (Alemanha)

2013 - Alice Munro (Canadá)

2015 - Svetlana Alexievich (Bielorrússia)
2018 - Olga Tokarczuk